Aconteceu ontem.

A percepção, não a ruga.

Há alguns dias, meu filhote de 3 anos pegou meu celular para bater fotos numa manhã como outra qualquer. Não prestei atenção a nenhuma delas até ontem, quando, clamando por espaço, meu HD pediu um tempo pra mim.

Então eu a vi! Clara e marcada. Personagem principal de uma longa sequência de fotos do meu pequeno observador.

A cena era corriqueira e banal. Brincávamos eu, ele e o irmão na minha cama.

Nada fora do padrão.

Nenhuma bronca a ser dada.

Nenhuma lição a ser ensinada.

Mas lá estava ela em todas as fotos.

Uma persistente ruga de preocupação. Constante. Bem no meio da minha testa.

Não que eu não esteja pronta para ser madura, esse nunca foi o problema.

Mas vi pelo olhar dele uma mulher cansada, acabada e abatida.

Eternamente preocupada.

Preocupada com o quê, exatamente?

A essa altura, nem eu mesma saberia explicar.

Não sei se pensava no que almoçaríamos… ou na próxima aventura… ou nas entregas de trabalho… ou nas demandas da casa… ou no estudo atrasado… ou na vacina a ser dada… ou no…

Pelos olhos dele, vi o sono, o cansaço molecular e as pequenas preocupações acumuladas.

Pelos olhos dele, vi que não existia a ilusão do disfarce. Ele viu. Ele vê. Ele fotografou.

Mas olhei pro olhar dele e não me reconheci.

Não reconheci o ser humano que quero ser e que julgava ser.

Certamente não consegui reconhecer a imagem da mãe alegre que gostaria de imprimir na memória dos meus meninos.

Me assustei!

Tive medo. Senti raiva. Tristeza.

Fui soterrada pela minha própria incapacidade de lidar com o mundo.

Quando cansei de me preocupar pela imagem, me preocupei com a preocupação em si.

Me preocupei com os efeitos sobre o meu corpo e a minha mente de viver num estado constante de atenção e guerrilha. Me preocupei com a armadilha do excesso de preocupação que nos impomos ao fingir que somos covers de super-heróis sem capa, capazes de enfrentar o mundo inteiro.

Me preocupei com a nossa certeza (e ilusão) acerca de nossa adulteza e de nossa percepção pequena e totalmente distorcida da realidade.

E me senti, finalmente, grata por ter sido vista por alguém quando nem eu mesma parecia capaz de me ver no espelho.

Grata por meu pequeno observador por quem e com quem quero ser um ser humano cada vez melhor, mais leve, mais vivo!

Grata e confiante de que aprenderei com ele a aceitar rusgas e rugas apenas onde a elas couber existirem. Afinal, pode ser que eu ainda precise pegar emprestado seu olhar ou sua visão de mundo, de vez em quando, para me ajudar a tornar a caminhada mais leve e divertida!

Grata por meu pequeno fotógrafo da alma, capaz de apagar toda e qualquer descabida ruga com um sorriso numa ensolarada manhã!