Quem não se lembra da música “Dois pra lá, dois pra cá”, gravada por Elis Regina?
A letra refere-se à pessoa que, sentindo frio na alma, convida alguém para dançar e descreve seus conflitos, que incluem a ponta de um torturante band-aid no calcanhar.
De fato, dançar com o pé machucado deve ser terrível. No caso, delineia-se a mistura da dor física com a dor das emoções que perturbam a paz de espírito. Torturante mesmo!
Li o relato meio humorístico de um noivo que se aprontava para o casamento. Quebrou um vidro no banheiro e, com a afobação, acabou pisando nos cacos e cortou o pé. O sangue jorrou forte, enquanto batiam à porta, apressando-o. Diziam que quem pode se atrasar é só a noiva, enquanto ele tentava limpar o ferimento com papel higiênico, sem sucesso. Conseguiu colocar um curativo no corte e calçar as meias, de qualquer jeito. Chegou mancando à igreja e andou mais devagar do que lhe haviam recomendado… A festa, para ele, foi um suplício, principalmente na hora de dançar a valsa. Todos se admiravam da sua “emoção”, mas ele aguentou firme, até tudo acabar. Foi difícil tirar a meia, que grudou por causa do sangue ressecado… Nada que a lua de mel não curasse…
Há muitas histórias de pessoas que precisaram disfarçar a dor em situações especiais. Talvez você mesmo esteja passando por uma situação semelhante neste momento. Engolindo sua dor para dar apoio a amigos ou familiares.
Mães conseguem fazer isso como ninguém! Depressa esquecem o cansaço, o resfriado, as dores na coluna, entre outras, quando um filho adoece ou quando o marido precisa de uma cirurgia… Endireitam os ombros, levantam a cabeça e enfrentam o que vier. Pelo menos, a maioria delas age assim, penso eu.
Felizmente, além das mães, há ainda muitas pessoas disponíveis para ajudar o próximo. Adeptas da afirmação de Clarice Lispector: “Um amigo me chamou pra cuidar da dor dele, guardei a minha no bolso. E fui”.
São aqueles que, conscientemente ou não, desenvolveram o sentimento de empatia e conseguem demonstrar compaixão pela dor alheia, algo escasso nestes tempos de tanta frieza e indiferença.
Felizes dos que, como eu, já encontraram alguém para dar-lhes suporte na dança da vida, como um bom band-aid no calcanhar machucado.
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