Já aconteceu com você, ter de escolher entre amor e carreira? Qual a prioridade?

Tinha algumas certezas sobre esse tema, até que acompanhei de perto o que aconteceu com uma amiga, com seus trinta recém comemorados.

Ela tem uma bolsa de doutorado em Mendoza, oeste da Argentina, junto à Cordilheira dos Andes. Ele, já pós-doutor, inicia sua carreira acadêmica em Jujuy, mais ao norte do país. A distância entre eles? Cerca de 1.300 km, mais longe que São Paulo – Porto Alegre.

Ela estuda algo muito complicado para eu explicar, mas tem a ver com as árvores de regiões frias. Não tinha como mudar o tema do seu doutorado. Era o momento de focar no trabalho, de aproveitar essa bolsa de estudos. Ele, por estar começando sua carreira acadêmica, também não podia deixar sua cidade.

Três anos de namoro. Ela aqui, ele lá. Encontros e despedidas.

Porém (é, sempre tem um porém), ele não era o tipo de pessoa que lidava bem com relacionamento a distância. Gostava da convivência do dia a dia, de estar ao lado, abraçar, dividir uma refeição, pegar na mão ao andar pela rua. E ele superou essa vontade por longos três anos, até que conheceu uma menina da sua cidade. La chica era bonita, simpática e vivia no mesmo bairro.

Aí foi quando ele pegou um ônibus e viajou por 20 horas para encontrar minha amiga e terminar o namoro (o que, digamos, mostra o quão honrado ele é). Poucas horas e muitas lágrimas depois, ele se foi. Estava tudo acabado.

Chegamos à conclusão que estavam em momentos diferentes. Afinal, não é isso o amor? Estar na mesma sintonia? Se ela pudesse abrir mão do trabalho, tudo se resolveria. Mas, aos 30 anos, já doutoranda, era como abandonar o barco de maneira irresponsável.

Amar podia ser algo mais lógico, às vezes. Ela deixaria de gostar dele, escolheria ficar com muita raiva e se motivaria a buscar alguém que a fizesse feliz. Um amor que fosse geográfica e profissionalmente viável. Mais fácil, não?

Não.

Minha amiga, num surto de esperança, apareceu com novas opções para ele: ficar um tempo lá, fazer seu doutorado a distância… (Engraçado. Essas opções nunca tinham aparecido. O que mudou? Por que, de uma hora para outra, ela foi muito além do que havia se proposto antes? O choque do rompimento a fez tomar atitudes que não eram cogitadas. E não por desconhecimento, mas porque simplesmente não existiam. Nada como uma mudança de perspectivas).

Tudo muito bonito e cor-de-rosa. Mas ele estava decidido ao fim da relação. Foi categórico: ‘não tente aumentar nosso sofrimento. Minha decisão é final’.

O barco já tinha passado. Era a hora do xeque-mate. Contra todas as negativas lógicas dele, minha amiga entrou naquele ônibus. 20 horas depois, estava na porta dele, com a cara lavada, pedindo para voltar.

Eu estava em casa, acompanhando esses duros passos, com atualizações fragmentadas, como se fosse um emocionante jogo de vôlei em que se vê só a pontuação, sem imagens.

Não pude acreditar quando ele a acolheu com o seu amor de sempre. Meu mundo lógico foi por terra. Peguei minhas certezas e as deixei guardadas. Ali no lixo reciclável.

Não existe momento certo para amor e carreira. Cada um constrói a sua prioridade. Ainda bem.