Trouxe de Holambra dois vasinhos de brinco de princesa cheio de botões prestes a abrirem.

Um ficou comigo, outro com uma amiga querida, de presente.

De setembro pra cá, a minha quase morreu umas tantas vezes: faltou água, sobrou sol, vento atrapalhou.

Confesso: estive descuidada esses últimos tempos com minhas plantas – e comigo mesma também, não vou mentir.

O resultado? Já nas primeiras semanas, os botões – que eram plenas promessas de alegria – secaram completamente. Sem abrir. O cor-de-rosa cheio de vida deu lugar a um marrom enferrujado, prova inegável da minha negligência.

Não havia nenhuma praga, nada que atrapalhasse o florescimento belo e natural daquela planta. Era só ter colocado água, for God’s sake!

Não podia deixar que ela morresse assim, por puro desleixo meu.

Logo eu, a menina do dedo verde.

Apelei para o salitre, ressuscitador vegetal que poucas vezes me deixou na mão. Também tratei de arranjar uma sombra bem exclusivinha, pra ver se ela engatava depois da necessária poda.

Como me doeu arrancar os botões ressequidos daquela planta indefesa que culpa alguma tinha da minha falta de cuidado.

Eu sei: a mudança de ambiente também pode ter atrapalhado seu desenvolvimento. Nem todo mundo se adapta a novos ares tão facilmente.

Sair de Holambra, a cidade das flores, e vir pra um quintal qualquer de São Caetano não deve ser, digamos, um upgrade dos mais bem-vindos do Reino Vegetal.

Concluí isso quando minha amiga, a que ganhou o vasinho gêmeo, relatou que os botões de seu brinco de princesa também haviam secado! Só podia ser a mudança.

Três meses se passaram, e nós duas fizemos nossa parte, cada uma em sua casa: rega, adubação, sombra, luz. E deixamos a natureza se encarregar do que apenas ela podia fazer.

E todo este texto é pra contar que, há poucos dias, recebi da minha amiga a foto de seu vasinho cheio de botões, novamente! Corri para olhar o meu e, feliz, constatei que estavam florescendo também. Estão vivos! Recomeçaram o ciclo!

Algumas coisas são naturais. Simplesmente obedecem à natureza, à estação, ao clima. E retribuem o cuidado sorrindo com flores.

Quantas situações talvez eu e você tentamos forçar para que aconteçam antes da hora? Nos relacionamentos, nos negócios, na vida. Vamos avançando despreocupados, quase inconsequentes. Muitas vezes, esquecemos que a vida é feita de fases.

As duas plantas eram idênticas, vindas do mesmo lugar. No entanto, ainda que separadas fisicamente, mantiveram o ciclo que foram criadas para seguir. E brotaram juntas, na época exata em que deviam florescer. Sincronia maravilhosa da natureza. Ponto.

Elas não sabiam do paradeiro uma da outra. Simplesmente foram obstinadas a seguir o propósito que lhes cabia. Cumpriram seus papéis. Não precisaram olhar para os lados, para ver se as outras plantas também estavam florescendo.

Vai vendo se você e eu somos assim, focados. Se conseguimos tão naturalmente nos reinventar, após as mudanças – drásticas ou não – a que somos submetidos todos os dias.

Vai vendo se podemos seguir sem olhar para os lados, ou sem nos sentir absolutamente frustrados quando a grama do vizinho é mais verde que a nossa.

Vai vendo se a gente consegue sobreviver sem a provisão que idealizamos, sob o sol cruel do dia a dia que nos queima a motivação e resseca os sonhos.

Vai vendo se canalizamos a seiva que recebemos todos os dias para a direção correta – que é a de florescer – e não a de cultivar espinhos.

Vai vendo quanta flor e quanto fruto deixamos de dar, na estação apropriada da vida, porque perdemos o foco com aquilo que não nos diz respeito.

Vai vendo o mundo virando demasiadamente social, quando deveria ser, apenas, natural.

O Menino do Dedo Verde é um livro infantojuvenil, do francês Maurice Druon, que conta a história de Tistu, um garoto que tinha o dom de fazer nascerem flores onde quer que encostasse o dedo. Se você ainda não leu, dá a mão aqui pra mim, dá?