Perder a hora é uma das piores coisas que pode acontecer no meu dia. Perder hora é perder vida. E vida não se perde, não, senhor.
Sabe aqueles sábados preguiçosos sem hora para acordar? Abomino-os.
Sabe aquela sensação de relaxamento após passar um dia inteirinho sem fazer nada? Nunca tive.
Sabe aquela liberdade de se esparramar na praia e sentir a brisa acariciar sua pele? Nem ideia do que seja.
Praia, por exemplo, é lugar de movimento! Não boto o pé na areia se não for para caminhar, fotografar, jogar vôlei, me acabar num futebolzinho, dar tudo de mim no squash, brincar de pular onda com a criançada ou me ocupar com quaisquer outras a-ti-vi-da-des. Ler também vale, num dia de pouca disposição física ou menor benevolência climática.
Foi-se o tempo em que achava o máximo me besuntar de Cenoura e Bronze e gastar minhas horas torrando no sol feito frango assado. Ou lagartear na esteira até pegar no sono e acordar com aquela sedutora marquinha de urso panda, dos óculos de sol esquecidos na cara. Como eu tinha energia para desperdiçar!
Hoje em dia, se, por engano, distração ou excesso de cansaço, durmo até às 11h da manhã num final de semana – coisa que, depois do nascimento da minha filha de 2 anos tornou-se totalmente impossível – acordo triste, e não descansada. Como poderia estar feliz se perdi metade do dia?
Sim. Pertenço à esquisita espécie dos que estão perdendo tempo quando dormem mais que o necessário. O sentimento que devia ser de alívio pós-descanso vira ansiedade da mais pueril, daquelas típicas de criança birrenta. É incontrolável a frustração quando se desperdiça tempo!
Dormir é necessário. E bom. Inegável, entendo. Mas estar acordado é TÃO melhor! (Antes que me confundam, já aviso que não cheguei ao estágio evolutivo dos seres adictos por endorfina que levantam às 5h da manhã para malhar. Não me refiro a esse tipo de determinação, de se cuidar, e tal. E sim ao desespero de “não fazer nada”).
Sou do clube dos hiperativos. Não falo da patologia em si, que é séria e deve ser tratada, mas sim daquela pressa de viver o melhor “hoje” possível.
Os minutos no banheiro, por exemplo, são “meu momento Instagram”. Já as viagens são ideais para listar pendências (com o cuidado de jamais ler durante o trajeto, não fazer muitas anotações, nem dar as costas para o sentido em que se anda, sob pena de vomitar nos coleguinhas). O trânsito nos dá a excelente oportunidade de ouvir audiobooks ou podcasts interessantes. Ou de atualizar o papo no viva-voz com os amigos.
Para mim, semáforos vermelhos foram feitos para que terminássemos a maquiagem a tempo. Outro dia um colega de trabalho quase enfartou quando me viu dirigir com o joelho, enquanto finalizava o rímel. Estava tudo sob controle, tenho pernas compridas. Mal sabia ele que, sozinha, faço tudo isso enquanto como uvas e retoco o esmalte. Na Avenida dos Bandeirantes. Enquanto desvio de motoboys enfurecidos. Aqui é produtividade, irmão.
Quero aplaudir em pé o sujeito que concluiu ser a vida curta demais para que se remova o pen-drive com segurança. Com certeza era do clube dos hiperativos.
Se tem uma coisa que me tira do sério é gente lenta. Ou burocrática. As duas características combinadas são extremamente perigosas perto de mim. É sempre na minha vez que acaba o papel da maquininha registradora no supermercado.
Ah, e a moça do caixa não sabe o código da manga Tommy. Pega a tabelinha. Tá em ordem alfabética. Ela começa do A, vai passando o dedo linha por linha – e lendo alguns em voz alta. Eu não quero saber se ela está surpresa com a promoção do abacate, mas ela tem tempo, quer conversar. Aquele lado da tabela só vai até a letra J. Não aguento:
– Tá do outro lado, moça.
Não me ouviu. Continua deslizando o dedinho lentamente sobre o papel contact. Vira a tabela. Acha a manga! Suspiro de alívio. Digita o código bem devagar, com o indicador durinho, feito mãe mexendo em smartphone novo. Percebo que ela viu o código errado. Desespero. Prevejo o martírio que me espera, tento rapidamente avisar. Já era. Registrou a Manga Palmer, mais cara. Reclamo.
– Ah, não é a Palmer, essa?
– Não, não é.
– Só um minutinho, vou chamar a gerente pra cancelar.
Acende a luzinha. Gerente para em três outros caixas antes do meu. E esquece o cartão – que é a única coisa que ela deveria carregar, mas prefere trazer aquela cara de poucos amigos. Cancela. A colega pega de novo a tabelinha de códigos… Aaaaaahhhh! Inspiro. Expiro. Inspiro. Expiro.
– Vai querer CPF na nota?
– Sim. 326.356…
– Só um minutinho… 356?
– Não, 326.356…
– Mas você falou que não era 356.
– Primeiro 326, depois 356!
Parabenizo as raras pessoas que são ágeis e assertivas em suas funções. Sério mesmo. Elas são o contrapeso do universo.
Equilibram o planeta, de forma que os desafortunados que não entendem piadas de primeira possam continuar existindo sem que haja fissura nuclear na galáxia. Porque alguém competente está executando rapidamente sua função.
E tudo vai ficar bem, na média.
Tá. Concordo que “descanso” é uma coisa relativa e que tem gente que vive muito feliz, obrigado, dormindo algumas horinhas a mais no final de semana, ou deixando a vida passar pela janela, sem pressa.
Fui agraciada de casar com um rapaz que é meu extremo oposto nesse quesito. Sua paciência permanecerá inabalada mesmo que acabe o papel de todas as maquininhas de supermercado do bairro. Estará lendo algum livro no celular enquanto espera. E tudo bem. Adora a paz de um dia sem planejamento. Sonha com um final de semana de pernas para o ar – tão raro, tão necessário, segundo ele, para recalibrar as energias.
Ah, se não fosse por esse moço… Talvez eu nem estivesse mais aqui para falar sobre as crises dos trinta e poucos anos, acometida de algum ataque cardíaco (e, se assim fosse, ele certamente não teria aberto mão de ver qualquer coisa na TV para jogar tantas partidas de Imagem e Ação nas reuniões de família).
Desconfio que mundo precise desse tipo de equilíbrio pra não colapsar.
Mas agora preciso sair correndo, com licença. Finalmente chegou minha vez na fila do banco.
Aaaaai gente! Muito amor por esse texto! Me identifiquei em vários momentos, não 100% confesso, mas é incrível como somos parecidas!
Certa vez, numa viagem pela Europa, estávamos tão cansados que o Thi não queria acordar no dia seguinte, confesso que aquela cama de hotel estava deliciosa, mas virei pro lado dele, olhei profundamente em seus olhos e disse “não da pra ficar aqui com uma Paris acontecendo lá fora”, então pulamos da cama! 🙂
Também já vi essa cena, Vivian… rs… Não consigo ficar deitada com uma VIDA acontecendo lá fora… 🙂