Dizem que depois dos trinta nos vira uma chave: ‘plim’.
De repente, precisamos dormir oito horas por dia. Surgem os primeiros cabelos brancos. Entramos na categoria ‘senhor’ e ‘senhora’. Preferimos tomar uma cerveja boa ao invés de vinte ruins. Bate aquela crise profissional. Alguma parte do nosso corpo dói. Não queremos usar o Snapchat, seja lá o que for isso. Não sabemos de onde vieram todos esses quilos, e nem para onde vão. Brotam crianças em nossas timelines. Temos surpreendente confiança em nosso taco. Descobrimos que nossos pais estão dobrando o cabo da boa esperança. E nos identificamos com quem sabe o que essas expressões significam.
Daí a gente aceita, e diz pros outros que a vida é assim, mesmo.
Só que, láááá no fundo, está bombando uma trilha sonora daquelas de super-herói:
– Tenho trinta anos, mas a real é que ainda sou aquele adolescente destemido. Só que agora eu sei muito sobre a vida. Rá. Me segura, universo.
Com o tal ‘plim’, parece que brota de dentro da gente uma persona ultrapoderosa. Um tipo de elfo com sorriso de mascote da Colgate, corpo de Hulk (ou Mulher Maravilha) e inteligência sobrenatural de Professor Charles Xavier.
Temos a pseudo-sensação de que vivemos o suficiente para saber tudo. Não queremos apenas contrariar nossos pais para nos auto afirmar, como talvez tenhamos feito na adolescência. Contestamos porque temos a plena convicção de estar certos. “Eles não sabem como as coisas funcionam hoje em dia”. Nós, os foderosos balzaquianos, é que temos razão.
Quando saímos da fase-desapego dos 20 e poucos anos, parece que entramos num tipo de ápice da vida. Afastar-se dele é reconhecer-se, de certa forma, frágil. Adultos são chatos.
– Quero continuar sendo Peter Pan. Muito mais divertido!
– Pensando bem, não preciso dormir oito horas, não. Bobagem. E meu corpo tá ótimo. Malho, canto, danço, represento. Ainda pedem até meu RG pra comprar bebida alcoólica! Estou muito bem.
– Filhos? Talvez. Mas tenho tantos planos, tantos projetos prioritários. Quero viajar. E o feriado, que não chega nunca? Abre aí esse vinho, vai.
– Estou pensando em empreender. Cansei de ganhar dinheiro pros outros, e… Ah, não! Mais um cabelo branco?
Conhecemos as chamadas crises, das mais diversas: emocionais, familiares, sociais, políticas. Enfrentamos, inclusive, a crise da perda (para os que ainda não passaram por ela por motivos trágicos ou antinaturais). Percebemo-nos a cada dia mais parecidos com nossos pais – involuntária e inevitavelmente. Ao mesmo tempo, constatamos que eles estão envelhecendo, e, a qualquer momento, podem ir embora. E pais jamais deveriam ir embora.
Descobrimos, meio no susto, que a vida é feita de fases. Então viver a primeira etapa da idade adulta consciente meio que assusta. Daí a negação. Assumir responsabilidades não é lá a coisa mais agradável desse mundo.
Já basta o trabalho, que consome significativa parte do nosso tempo e imensa parte da nossa alegria. Basta o financiamento do carro, da casa, da ALMA. Basta assistir à vida perfeita dos nossos amigos de Facebook que nunca vieram para um churrasco, e cujos filhos só conhecemos por fotos de esplendorosos ensaios newborn.
Ser adulto é um troço complicado. Não importa se pertencemos ao time dos solteiros convictos, dos casados-para-sempre ou dos don-juans-inveterados – todos esses nas modalidades com e sem filhos.
O clube dos tais trintões é essa pluralidade toda aí. Mas, qual a beleza de estar nessa fase da vida, se não todos os contrastes?
Então, caros balzaquianos, enquanto ainda não contamos a vida em primaveras, nossos peitos não caíram e ainda temos energia para o futebol semanal – coisas que certamente mudarão daqui a uns poucos anos –, vamos lidar com o hoje. Ver o nascer ou o pôr-do-sol com mais atenção. Trocar umas experienciazinhas, aqui e acolá.
Menos mimimis, mais aromas de maçãs. Tá bom? Então tá bom.
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