Já estava com meus trinta e poucos e deduzi, por pura lógica:

tinha ficado pra titia.

Cabeça de engenheira funciona assim: existe um percentual da população que não casa. Logo, no meu círculo de amizades do colégio, tinha que ter algum solteiro convicto. Se meus amigos estavam se casando, era matemático: tinha sobrado eu.

Coitadas das minhas amigas, ávidas por enturmar seus maridos em nossa roda de amizades. Em cada encontro, conheciam um novo namorado meu. Não porque eram muitos; os encontros é que eram poucos.

Confesso que era bem feliz assim. Curtia meu status quo sem nenhum trauma.

Minha mãe sofria um pouco mais, como sofrem as mães. Tentava de tudo para me casar, até crenças populares. Uma vez ela me deu dois pequenos candelabros:

– Tem que colocar no quarto, para atrair parceiro.

Sempre muito relaxada que fui, no quesito decoração e móveis, olhei para os lados e só vi um colchão de casal e um tapete. Nada mais. Pra quê?

– Mãe, não tenho onde colocar esses candelabros!

Ela não teve dúvida:

– Coloca no chão mesmo. O importante é estar no quarto. Se não, não funciona!

Morri de rir. E, para não desapontar tanto minha mãe, lá ficaram os dois objetos, perdidos sobre o tapete, ao lado do colchão.

Até que um dia eu estava de férias no Aconcágua – lugar bastante improvável para que a teoria do candelabro acontecesse. E, naquela trilha, a quase 7.000 metros de altura, notei que havia um cara pra lá de interessante.

(Uma informação aos que não são muito ligados a caminhadas: o Aconcágua é a montanha mais alta das Américas. Por isso, a subida exige muitos dias de aclimatação, já que o oxigênio vai diminuindo à medida que o nível do mar se distancia).

Foram 14 dias de convívio intenso, caminhando, curtindo a paisagem e dormindo em barraca. Só depois do final da viagem é que realmente nos conhecemos. Menos mal, pois deu tempo de tomar aquele necessário banho de 3 horas, antes de nos aproximarmos.

Parece a estória do príncipe encantado versão 3.7: cliente e guia se apaixonam e são felizes para sempre. Porém, havia detalhes importantes:

1. Eu morava em São Paulo, Brasil; ele, em Mendoza, Argentina.

2. Eu era uma futura executiva de sucesso. Ele, um guia de montanha.

Deixei rolar, sem pressão. Ele veio a São Paulo num Carnaval, e esse foi o começo de inúmeras idas e vindas. Depois de um ano, cansei da relação à distância. Tinha de tomar uma decisão.

Ele já havia dito que não gostaria de sair de Mendoza, e me parecia um crime trazer um montanhista para a selva de pedra. Portanto, estava em minhas mãos saber se queria mesmo continuar com ele a ponto de ir morar em outro país.

Sempre fui muito lógica e conservadora nas minhas decisões. Por sorte, vários aspectos da minha vida que estavam em plena mutação naquele momento.

Depois de mais de 10 anos ralando muito, muito mais do que as básicas 8 horas por dia, eu estava exausta. Não que eu soubesse muito para onde ir, mas estava começando a pensar que aquela vida empresarial não era para mim.

Também estava aborrecida com o trânsito. Já tinha tentado ir ao trabalho de trem, mas desistir de entrar e sair dele carregada pela multidão. Tinha apostado também em ir de bicicleta, e fui atropelada em plena faixa de pedestres por um taxista.

Tudo isso me encorajou: vou morar na Argentina.

Não foi fácil decidir. Mas ficou mais simples quando me lembrei que não era uma decisão para o resto da vida. Eu podia voltar atrás, afinal, não há nada de errado em mudar de opinião.

Esse, então, foi o início de um grande planejamento. Apesar de apaixonada, eu ainda era a mesma engenheira de sempre.

Pretendo compartilhar em breve mais detalhes da vida que seguiu – e segue – por aqui.

Se eu pudesse, enquanto isso, deixar um conselho, seria: vá para o Aconcágua esteja bem com você mesmo, solteiro ou casado. Tudo fica muito mais tranquilo, assim.